Supremo decide que estados e municípios têm poder para definir regras sobre isolamento
Os nove ministros presentes à sessão
votaram de forma unânime em relação à competência de estados e municípios para
decidir sobre isolamento. Por maioria, o plenário entendeu ainda que o Supremo
deveria deixar expresso que governadores e prefeitos têm legitimidade para
definir quais são as chamadas atividades essenciais, aquelas que não ficam
paralisadas durante a epidemia do coronavírus.
Os ministros julgam uma ação do PDT contra
medida provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro com
o objetivo de concentrar no governo
federal o poder de editar uma norma geral sobre os temas.
A MP alterou uma lei de fevereiro, que
previa quais ações poderiam ser tomadas durante a crise gerada pela pandemia do
coronavírus.
O partido considerou que as
modificações na legislação feriam a Constituição. Também argumentou que é
tarefa de União, estados e municípios, em conjunto, a competência para
estabelecer políticas relacionadas à saúde; e que só por lei complementar –
para a qual é necessária maioria absoluta de votos no Senado e na Câmara – é
possível estabelecer regras de cooperação no tema entre União, estados e
municípios.
Em março, o ministro Marco Aurélio Mello,
relator do caso, concedeu liminar (decisão provisória) para
reforçar que tanto União como estados e municípios têm competência para
legislar sobre medidas de saúde. Portanto, no entendimento dele, governadores e
prefeitos podem estabelecer regras de isolamento, quarentena e restrição de
transporte e trânsito em rodovias e portos.
Na sessão desta quarta, o ministro
defendeu a confirmação da liminar pelo plenário. Marco Aurélio Mello disse que a MP
foi editada para combater os efeitos da pandemia, mas faltou entendimento.
“Há de ter-se a visão voltada ao
coletivo, e talvez o que falte nesta quadra, presidente, é entendimento”,
afirmou.
Alexandre de Moraes afirmou que a
competência comum não permite que todos os entes federais possam fazer tudo
porque isso gera uma “bagunça ou anarquia”.
De acordo com o ministro, a coordenação
das medidas compete ao governo federal, mas, a partir de critérios técnicos,
estados e municípios, dentro de seus espaços normativos, podem fixar regras de
distanciamento social, suspensão de atividade escolar e cultura, circulação de
pessoas.
Ele ressaltou que governadores conhecem
melhor as realidades regionais e os prefeitos, as locais. “Não é possível que a
União queira ter monopólio da condução administrativa da pandemia. É
irrazoável", declarou.
Edson Fachin defendeu que estados
e municípios podem, inclusive, estabelecer quais são as atividades essenciais,
aquelas atividades que não sofrem restrições de funcionamento durante a crise.
Ele afirmou que a atuação do governo federal deve seguir parâmetros, inclusive,
internacionais.
“As regras constitucionais não servem
apenas para proteger a liberdade individual, mas também o exercício da
racionalidade coletiva, isto é, da capacidade de coordenar as ações de forma
eficiente”, afirmou.
Luís Roberto Barroso se declarou
impedido de participar do julgamento “por motivo de foro íntimo”, mas
aproveitou para cobrar unidade em torno das ações para combater a crise.
“Eu acho que o enfrentamento dessa
questão da covid-19 [doença provocada pelo coronavírus] exige coordenação,
liderança, racionalidade e exige cooperação entre os entes estatais. Não pode
ser tudo centralizado e nem de uma forma que cada um corra para um lado”,
afirmou.
Para a ministra Rosa Weber, da saúde é uma
competência comum administrativa e que "cabe ao Brasil valer-se da estrita
federalização para evitar o caos".
Segundo a ministra, é possível que
sejam editadas medidas diferentes e até mais rígidas de controle do coronavírus
diante das realidades de cada local, respeitando o princípio da
proporcionalidade.
Ricardo Lewandowski afirmou que o
federalismo cooperativo exige que governos federal, estadual e municipal se
apoiem mutuamente. O ministro disse que é preciso diálogo e liderança
cooperativa.
"Já foi sublinhado aqui com muita
precisão que estados e municípios não podem ser alijados nessa batalha porque
eles têm o poder, o dever de atuar", disse.
Gilmar Mendes disse que o
presidente da República não pode atropelar competências federativas, assim como
os estados e município não podem atropelar as competências da União.
“Nós temos no eixo SP, RJ e Minas 100
milhões de pessoas. A metade dos habitantes do Brasil vive nesse eixo.
Portanto, sobre os governadores desses estados, recai uma imensa
responsabilidade. (...) Tudo isso faz crescer a responsabilidade dos estados e
municípios. Por isso, que esta Corte tem afirmado que, a despeito da
competência da União, subsistem as competências dos estados e municípios para
lidar com o tema", afirmou.
Segundo Luiz Fux, o Supremo já decidiu que normas gerais da União deveriam
prestigiar a legislação local, exatamente porque representava uma proteção mais
eficiente do que a norma federal. O ministro citou ainda que Estados e municípios
devem ouvir as agências reguladoras, que podem sugerir os melhores meios para
se determinar uma atividade como essencial.
“Acompanho voto do ministro relator,
com a interpretação conforme, conferindo a todas as unidades federadas o poder
de enumerar atividades essenciais, devendo ouvir agências reguladoras por falta
de expertise para definir as atividades essenciais”, afirmou.
Último a votar, Dias Toffoli entendeu que
não era preciso deixar expresso que estados e municípios podem definir quais
são os serviços essenciais. Para o presidente do Supremo, isso já seria
implícito a partir do entendimento do plenário.
“Na decisão do relator, essa conclusão
já está clara o bastante, o suficiente”, disse o ministro.
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